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Morar Fora: Sydney, Austrália, por Polyana Moura

Começamos, na semana passada aqui no blog, a série “Morar Fora”, com entrevistas com brasileiros que moram em outros países, que publicarei a cada semana. A primeira, com Mara Nogueira, residente de Amsterdã, foi um sucesso de visualizações e compartilhamentos.

E para esta semana, vamos para o outro lado do mundo, com Polyana Moura, que há quase 3 anos vive em Sydney, Austrália. O país é hoje o terceiro mais procurado por brasileiros para intercâmbio, segundo pesquisa da Belta (Associação de Agências de Intercâmbio).

Foi através do intercâmbio que Polyana se mudou para a Austrália e depois acabou estendendo o período no país, que é considerado também um dos mais receptivos para imigrantes.

Nesta entrevista, Polyana nos contou como foi a escolha de morar na Austrália, como foi a adaptação ao país, as diferenças culturais e os aprendizados que tem ganhado com essa experiência.

Polyana Moura vive na Austrália há quase 3 anos

Compartilhe Viagens: Há quanto tempo você mora em Sydney, na Austrália, e o que a fez mudar para a cidade?

Polyana Moura: Cheguei em Sydney em fevereiro de 2014. Vim pra cá a princípio pra fazer um intercâmbio de inglês. Eu havia acabado de me formar na faculdade (literalmente um mês antes, em Odontologia) e ainda não tinha criado nenhum vínculo de emprego no Brasil, então pensei que se eu nunca tinha feito um intercâmbio antes, seria um daqueles casos de “agora ou nunca”. Vim com a passagem de volta comprada, mas saí do Brasil com uma aplicação para bolsa de estudos de pós graduação na Universidade de Sydney. A resposta foi positiva e eu acabei ficando. Mas o que me fez escolher Sydney especificamente… Bem, antes de vir, eu não tinha tanto conhecimento sobre a realidade da Austrália, para ser sincera. Minha escolha foi feita basicamente baseada no incentivo de uma das minhas melhores amigas que já estava aplicando para a mesma bolsa de estudos e planejava vir. Isso somado ao fato de que quando entrei em contato com alguns professores da Universidade de Sydney, me apareceu essa excelente oportunidade para desenvolver uma pesquisa por aqui.

Como foi a adaptação ao país, o que foi mais difícil?

Olha, morar fora não é apenas um mar de rosas também. Muitas coisas são difíceis até hoje. Acho que a questão do fuso horário e da enorme distância que me separa do Brasil pesam bastante. É difícil falar com a família e amigos mesmo online por questão de incompatibilidade de horários. Quando eu estou livre, eles estão trabalhando ou dormindo e vice versa. Claro que há um choque cultural também. Aqui as pessoas se apresentam com apertos de mão e não entendem muito sobre essa cultura brasileira de “abraçar e dar beijinhos”. Aqui as pessoas almoçam com seus computadores, sabe? Cada um traz sua marmitinha para o ambiente de trabalho, esquenta no microondas e vai, isoladamente, desfrutar do seu almoço na companhia agradabilíssima do seu próprio computador. No primeiro ano me perguntei todos os dias aonde estava aquela mesa de almoço em família/amigos de todos os dias que eu era acostumada a ter no Brasil.

Mas acho que o mais difícil de tudo pra mim foi o fato de que Sydney, especificamente, é uma cidade bem transitória. A quantidade de gente que vem para cá para passar um período e depois voltar pra seu país é absurda. Tudo muda o tempo todo. E logo de início eu fiz muitas amizades com pessoas de todos os lugares do mundo, mas ao mesmo tempo eu ia para uma festa de despedida todo final de semana. A gente termina virando um pouco mais frio sabe? Tentando se apegar menos, talvez. Hoje tenho um grupo de amigos maior e de pessoas que estão/vão ficar por períodos mais longos, então, criar certos tipos de laços funciona como raízes que tornam tudo mais fácil.

Atualmente, você é apenas estudante ou também trabalha na Austrália? Como funciona o visto para estudar e trabalhar e que tipo de trabalho você pode fazer?

Sou estudante e trabalho. O visto de estudante para brasileiro na Austrália dá direito a trabalhar por vinte horas semanais. Muitos brasileiros vêm pra cá pra trabalhar com “o que aparecer”, em restaurantes, na obra, em lojas, fazendo mudança… Existem várias opções. Mas o mais legal é que o abismo social aqui não é tão grande. De maneira tal que o pedreiro, a faxineira, o dentista, o advogado e o auxiliar de cozinha viajam nas férias, frequentam os mesmos lugares, sentam nas mesas dos mesmos restaurantes, moram nos mesmos subúrbios e até no mesmo prédio.

Eu não trabalho muito, pois minha prioridade aqui é de fato o doutorado que faço, mas trabalho aos sábados em uma clínica de odontologia. Sou auxiliar de dentista e o trabalho serve para me ajudar com as despesas.

Quanto tempo ainda você pode ficar na Austrália? Você sente vontade em morar mais tempo no país?

Tenho mais dois anos de curso e alguns meses extra de visto. Minha bolsa é do Brasil e eu tenho que voltar ao final do curso, então tento nem pensar muito sobre as minhas vontades para não ficar louca. Mas posso dizer que concordo com o poeta quando ele diz que o mundo é grande demais para nascer e morrer no mesmo lugar.

Do que você sente mais falta no Brasil?

Sem dúvida, a família e amigos são os que fazem mais falta. Em segundo lugar sinto falta da energia do povo brasileiro! A alegria da nossa gente é singular!!! Mas se eu desconsiderar “pessoas” e “emoções” da lista de coisas que sinto falta, acho que escolheria a comida! Hahaha. Sou nordestina e vamos combinar que a comida do nordeste brasileiro é a melhor DO MUNDO. Mesmo tendo algumas boas opções de restaurantes brasileiros, não se acha nada igual aqui!

O que a Austrália, especialmente Sydney, tem que você gostaria que tivesse no Brasil também?

Estou aqui há dois anos e oito meses e o que mais me encanta é a liberdade que tenho aqui para ter uma vida “outdoor” sem me preocupar com segurança. Literalmente você pode sacar dinheiro nos caixas eletrônicos a qualquer hora do dia, pode andar com o celular a mostra no ônibus, no trem, nas calçadas, e, pasmem, mulheres podem andar sozinhas mesmo de madrugada na rua que não há perigo. Eu mesma já cansei de voltar sozinha a pé de madrugada pra casa quando estava cansada e meus amigos queriam continuar na balada, por exemplo. É quase surreal tentar explicar isso pra minha mãe, que ficava preocupada toda vez que eu estava parada por meros dois minutos na frente da casa dos meus pais, de carro, esperando o portão abrir para poder estacionar.

Além disso, tem um aspecto da cultura australiana que eu admiro muito. Aqui se trabalha pra viver e não o oposto. Claro que existem exceções, mas a maioria das pessoas trabalha o suficiente para garantir um happy hour no final do dia, uma viagem no final do ano. As pessoas são menos apegadas a luxo e ao status aqui. Sem contar a tolerância com as diferenças!! Ah isso eu queria muito encontrar no Brasil.

“Aqui na minha unidade de pesquisa me apelidaram de ‘hug maniac’ (maníaca do abraço), pois brincam que eu tenho essa ‘Brazilian thing’ de gostar de abraçar”

Como você se sente hoje? Já se sente um pouco “aussie”?

Ah, claro que a gente muda um pouco pra se adaptar. Incorpora alguns jeitos de falar, concorda com pensamentos que antes discordava, aperta mãos com mais frequência, tolera menos a famosa impontualidade brasileira, etc. Mas, por melhor adaptado que você esteja, o brasileiro sempre se reconhece mesmo antes de abrir a boca. Então, eu acho que mudei algumas coisas, mas em geral sou brasileira à léguas de distância! Inclusive, aqui na minha unidade de pesquisa me apelidaram de “hug maniac” (maníaca do abraço), pois brincam que eu tenho essa “Brazilian thing” de gostar de abraçar até árvores, se deixarem. Saio do Brasil, mas o Brasil não sai de mim! Hahaha.

Muita gente brinca que o inglês australiano, muitas vezes, é incompreensível até para outros nativos de língua inglesa. O que você acha? Existe muita diferença? Você pode citar algumas expressões tipicamente australianas que você já incorporou ao seu vocabulário?

Existe muita diferença. Mas é questão de se acostumar. Como, às vezes, o português de Portugal não é tão simples de se entender, pelo menos eu -que não estou acostumada- não acho. A questão é que o inglês americano e britânico viaja o mundo pelas telas de cinema e músicas, mas o australiano costuma ficar por aqui. No Brasil, fiz curso de inglês no Senac e cheguei aqui crente abafando que iria só aprimorar uma língua que eu já tinha uma boa base. Já do aeroporto não consegui entender quase nada que o pessoal da imigração me falou. Mas Sydney é uma cidade com muitos imigrantes e os australianos daqui estão acostumados com isso, então, aliviam um pouco o sotaque que não é tão forte assim. Mas se você for mais para o Norte da Austrália aí sim, é quase outra língua. Além do sotaque -que já não é fácil-, existem as gírias!! Os australianos são mestres em abreviar TUDO e falar com gírias próprias. Barbecue -churrasco- aqui é barbie. Afternoon -arvo. Até o Mcdonalds aqui eles mudaram o nome e se chama de Maccas. Hahaha.

Quais as principais lições que você leva da experiência de morar fora do Brasil?

Eu poderia listar várias lições que aprendi morando aqui. A começar pelas clichês de aprender a cozinhar, lavar e passar (mentira, eu nunca passo minhas roupas), mas há uma grande lição sobre morar fora que é de o quanto as pessoas que ficaram no Brasil são importantes pra ti. O quanto elas fazem falta. O famoso “perder” para dar valor. Eu falei mais cedo sobre a questão de que australiano almoça com seus computadores, mas, olhando pra trás, lembro das diversas vezes que ouvi minha mãe reclamar porque eu estava almoçando com o whatsapp aberto. Ainda assim acho que a maior lição de todas é de que, apesar disso, apesar dessa saudade e desse sentimento de “relativa solidão”, você é muito importante pra você mesmo também.

No Brasil eu morava com meus pais. Nunca cheguei realmente a morar só por lá, mas sei que certas coisas eu não precisaria estar fora da pátria amada para aprender. Muitos amigos meus saíram das casas dos pais para morar sozinhos sem cruzar nenhum oceano e sabem cozinhar e lavar roupa melhor do que eu e até passam suas vestimentas. Mas quando você está fora do Brasil, você aprende o quão forte você é. Porque seus pais, sua família, seu apoio não está ali no bairro vizinho. Não está numa cidade a uma hora de distância. Ou mesmo você não está em uma cidade em que as pessoas ao seu redor falam a sua língua sequer. Você literalmente está sozinho com o melhor e o pior de si mesmo. Acho que a principal lição sobre morar fora do Brasil é pessoal. É o auto conhecimento. É a vida que você aprende a levar consigo ao mesmo tempo que percebe que o mundo não gira em torno do seu próprio umbigo sabe?

“Acho que a principal lição sobre morar fora do Brasil é pessoal. É o auto conhecimento.”

Que conselhos você daria para quem quer morar fora do Brasil, especialmente na Austrália?

Cuidado quando for atravessar a rua porque aqui o trânsito funciona do lado errado! Ahahaha brincadeira! Meu conselho seria um simples e puro “venha!”. Esse seria o melhor conselho. Acho que morar fora é um sonho que muitas pessoas têm e outras não e não há nada de errado com nenhum dos dois. Mas muitos dos que têm não vão atrás por medo, comodismo ou outro motivo. Esse é definitivamente um tipo de experiência de vida que vou querer para os meus filhos um dia e que recomendo para todos.

Gostaram da entrevista? Se tiver mais perguntas, deixem aqui nos comentários, que pedirei para Polyana responder, na medida do possível. Vocês também podem sugerir perguntas para as próximas entrevistas e os países que vocês querem saber mais.

Leia mais sobre a Austrália:

https://compartilheviagens.com.br/categoria/oceania/australia/

Outras entrevistas da série “Morar Fora”:

Morar Fora: Amsterdã, Holanda, por Mara Nogueira

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